Insetos! Muitas pessoas têm repulsa somente ao ouvir o nome, sejam motivados por medo e traumas mas, principalmente, pelo desconhecimento sobre estes animais. Os insetos são os animais mais diversos no mundo, com mais de 925.000 espécies descritas e uma estimativa de que se possam descrever ainda muito mais. Estes animais são importantes para o funcionamento do ecossistema de forma equilibrada, participando ativamente nos níveis inferiores da cadeia trófica, despertando interesse médico-sanitário no controle e transmissão de zoonoses ou, ainda, nos serviços ecossistêmicos.
Os serviços ecossistêmicos são caracterizados pelos benefícios diretos e indiretos que os seres humanos obtêm da natureza, abrangendo desde o fornecimento de recursos até funções ecológicas essenciais. Entre os serviços ecossistêmicos realizados por animais podemos destacar os de provisionamento (produção de mel, insetivoria, usos diversos na medicina), serviços culturais (i.e. turismo em borboletários), serviços de regulação (controle biológico de pragas) e serviços de suporte (dispersão de sementes, decomposição e polinização). Considerando os serviços de suporte e destacando a polinização, temos as abelhas como os principais animais polinizadores.
As abelhas são insetos pertencentes a ordem Hymenoptera, com mais de 16.000 espécies descritas no mundo. Para o Brasil, estima-se que a apifauna reúna mais de 1.678 espécies descritas em cinco famílias: Colletidae, Andrenidae, Halictidae, Megachilidae e Apidae. Considerados os polinizadores mais eficientes entre os animais, acredita-se que mais de 80% de todas as angiospermas são polinizadas por elas. A polinização feita por abelhas é conhecida como melitofilia e pode apresentar diversas formas. Além disso, a coevolução com diversas plantas possibilitou diferentes mecanismos na interação ecológica entre planta-polinizador, como veremos a seguir.
POLINIZAÇÃO POR VIBRAÇÃO
(BUZZ POLLINATION)
Entre as angiospermas (plantas com flores), cerca de 20.000 espécies disponibilizam somente pólen como recursos para os visitantes florais, sendo este o principal atrativo para polinizadores. Dentro desta categoria de plantas existe um grupo especial em que o pólen está armazenado no interior de pequenas estruturas conhecidas como anteras poricidas e só liberam seu conteúdo com vibrações na frequência certa. E é aí que entra a chamada buzz pollination (polinização por vibração), nome dado devido ao som produzido pelo zumbido das abelhas.
Algumas abelhas, como as popularmente conhecidas como mamangavas (Bombus spp.), pousam sobre as flores e os músculos torácicos (os mesmos interligados nas asas e utilizados para voar), sacudindo o pólen para fora, que recaem sobre seus corpos, polinizando demais as flores em outros forrageios. Um fato interessante sobre essa técnica altamente especializada está relacionado à polinização de diversas plantas as quais consistem na dieta de grande parte da população humana, como o tomate (Solanum lycopersicum) e o pimentão (Capsicum annuum), aos quais são polinizadas, também, através deste tipo de polinização.
POLINIZAÇÃO POR CONTATO DIRETO
Esse tipo de polinização é o mais comum e realizado pelas abelhas. Enquanto a abelha coleta néctar ou pólen, seu corpo encosta nas estruturas reprodutivas das flores, fazendo com que o pólen se fixe a ela e seja levado até a próxima flor visitada, realizando a polinização entre as espécies. Abelhas apresentam o comportamento de forrageio entre diversas flores da mesma espécie. Este comportamento aumenta significativamente a chance de polinização cruzada, o que favorece a variabilidade genética e melhora a qualidade dos frutos, por consequência.

Essa forma de polinização é frequentemente vista e retratada pelas abelhas mais conhecidas popularmente, as abelhas europeias (Apis mellifera). Entretanto diversas abelhas nativas brasileiras, conhecidas como abelhas sem ferrão, também a realizam, como as abelhas jataís (Tetragonisca angustula), mandaçaias (Melipona quadrifasciata) e uruçus (Melipona scutellaris), por exemplo. Essa polinização é essencial para diversos cultivos como as laranjeiras (Citrus sinensis), maçãs (Malus domestica) e o café (Coffea arabica), sendo um dos maiores serviços ecossistêmicos (ecológicos e econômico) que as abelhas oferecem à agricultura.
POLINIZAÇÃO POR FORÇAMENTO DE FLOR
Apesar das diversas complexidades e adaptações na relação entre planta-polinizador, nem todas as interações são, digamos, as mais belas de se ver. Algumas flores possuem estruturas mais fechadas, exigindo força para acessar o néctar.
Abelhas grandes, como as mamangavas, são especialistas nisso. Elas literalmente forçam a entrada na flor, empurrando as pétalas até alcançar o néctar. Nesse movimento, acabam dispersando o pólen e possibilitando a polinização da planta. Esta estratégia é frequentemente vista em plantas de largo cultivo, como o maracujá (Passiflora edulis) e o feijão-de-porco (Canavalia ensiformis).
POLINIZAÇÃO COM ROUBO DE NÉCTAR
(NECTAR ROBBING)
Apesar dos diferentes mecanismos (como odores e cores diversas) de direcionamento das plantas aos seus recursos florais para os polinizadores, nem sempre as abelhas seguem o “caminho certo”. Algumas abelhas perfuram a base da flor, acessando o néctar diretamente, evitando o contato com os órgãos reprodutivos das plantas. Esse comportamento é chamado de roubo de néctar, do inglês nectar robbing.
Entretanto, apesar do acesso ao néctar por um “atalho”, este comportamento ainda pode contribuir para a polinização de forma indireta, dependendo do quanto a abelha toca no pólen ao entrar ou sair da flor, promovendo a polinização cruzada ao deslocar para outras flores e plantas.
POLINIZAÇÃO NOTURNA
Embora a maioria das angiospermas apresentem flores com abertura diurna, outros fatores, como guias visuais de néctar ou pólen, odor, óleos e diferentes cores, favorecem a melitofilia em diferentes horários, o que permite a polinização noturna de certas espécies de plantas.
Apesar de pouco conhecida, a polinização noturna também tem grande importância. Algumas abelhas como as do gênero Megalopta, têm hábitos crepusculares ou estritamente noturnos, visitando flores que se abrem à noite. São fundamentais para plantas que florescem ao entardecer ou sob a luz da lua, como vários tipos de cactos, por exemplo.
ABELHAS NA CONSULTORIA
Dada a importância das abelhas, o Monitoramento Ambiental das espécies é exigido pelos órgãos competentes a diversos empreendimentos, como os de Mineração. Na CLam, são executados diversos projetos para o atendimento às condicionantes ambientais que visam a preservação das abelhas em seus locais de ocorrência, bem como suas utilizações como bioindicadores de qualidade ambiental, contribuindo de forma efetiva para o conhecimento da biodiversidade e preservação das espécies.
Para o monitoramento, são realizadas coletas das espécies por diferentes metodologias, sendo as mais comuns a Busca Ativa (com auxílio de rede entomológica) e Armadilhas Aromáticas (contendo substâncias atrativas às abelhas). Após a coleta, todo material coligido é devidamente armazenado, as espécies são identificadas em laboratório e ao fim, são destinadas às instituições científicas, como universidades e museus para contribuírem para o conhecimento da biodiversidade local e, por consequência, auxiliando na preservação das espécies.

Diversos fatores ameaçam as abelhas nativas no Brasil e no mundo. Entre os principais, destacam as atividades antrópicas que promovem a fragmentação de hábitats, o uso excessivo de agrotóxicos, a monocultura de grandes extensões territoriais e a introdução de espécies exóticas. As abelhas são verdadeiras engenheiras da polinização, com diferentes técnicas especializadas às flores que visitam. Assim, entender essas estratégias de polinização e comportamento animal nos ajuda a valorizar ainda mais a biodiversidade e a contribui com a conservação desses polinizadores e possibilitando a continuidade do uso de seus serviços ecossistêmicos de forma equilibrada.
Então, na próxima vez que ver um inseto zumbindo por aí, deixe a repulsa de lado e lembre-se: ele pode estar realizando um trabalho altamente especializado — e essencial para a vida na Terra.